Até segunda ordem, Lula embarca amanhã, domingo, para encontro com Xi Jinping na China. Até o fechamento desta newsletter, ainda pairavam dúvidas sobre um possível adiamento da agenda, já que o presidente foi diagnosticado com uma pneumonia. De todo modo, o anúncio das companhias de Lula em sua visita ao país asiático — visita essa que fecha a tríade de encontros com os principais parceiros comerciais do Brasil, após as viagens à Argentina e aos Estados Unidos — deixou organizações socioambientais vigilantes.
Uma comitiva empresarial organizada pelo Ministério da Agricultura e Pecuária, formada por 102 representantes do agronegócio, incluindo nomes de gigantes da indústria frigorífica, do algodão e de insumos agrícolas, embarcará na segunda-feira para acompanhar Lula. Como destacou o secretário-executivo do Observatório do Clima, Marcio Astrini, em artigo publicado no jornal chinês South China Morning Post, a China, como maior importadora de carne e soja brasileiras, influencia enormemente a atividade agropecuária no Brasil — e precisa agir para impedir que ela ocorra às custas de desmatamento e degradação ambiental.
O que se espera do encontro de Lula e Xi Jinping é que discutam as relações entre os países à luz da pauta ambiental e climática — honrando o compromisso de campanha de Lula de que essas seriam temáticas “transversais” em seu governo. Não dá para reduzir emissões e impedir o ponto de não-retorno na Amazônia sem zerar o desmatamento. E, para isso, é fundamental que parceiros comerciais do país se neguem a compactuar com a importação de produtos que acarretem na destruição da floresta.
Como o Observatório do Clima vem assinalando desde a posse de Lula, a ampla coalizão que o elegeu pode tornar difícil a concretização de seus compromissos. É preciso fazer escolhas e assumir lados, porque a ação climática não pode esperar. Como destacou o relatório-síntese do Painel do Clima da ONU lançado nesta semana, trata-se de uma questão de sobrevivência.
Também na agenda nacional há ameaças batendo à porta, como a Petrobras de olho na foz do Rio Amazonas, a desastrosa concessão de licença prévia à pavimentação da BR-319 - ainda não revertida - , e o risco de perda de um terço da água do Cerrado, causado principalmente pela ação do agronegócio.
Essas e outras questões, como o lançamento do relatório do Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa do Observatório do Clima, que analisou a “década perdida” no combate a emissões no Brasil, são tema desta newsletter. E fique de olho: na próxima segunda-feira (27/3), o Observatório do Clima lança o relatório Nunca Mais Outra Vez, o quarto e último da série que radiografou o desmonte ambiental implementado pelo regime Bolsonaro. O documento registra as minúcias da destruição com um extenso compilado de dados públicos e levantamentos exclusivos, para que isso nunca mais se repita.
Boa leitura.
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Petrobras quer explorar a foz do rio do Amazonas sem fazer avaliação ambiental adequada para o local
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A Margem Equatorial, uma área que engloba do litoral do Amapá, no extremo norte do Brasil, ao Rio Grande do Norte, no nordeste, tem atiçado a ambição de petrolíferas. Em 2013, a Agência Nacional do Petróleo (ANP) concedeu o direito à exploração de recursos fósseis a um conjunto de áreas, incluindo o bloco 59, localizado na foz do rio Amazonas, na costa da cidade de Oiapoque (AP) e com uma área de 766 km².
O Ibama, agora, analisa estudos e dados técnicos requeridos no licenciamento ambiental. O processo mais adiantado é justamente o do bloco 59, controlado pela Petrobras. A questão é que o poder público ainda não fez uma Avaliação Ambiental de Área Sedimentar (AAAS) na região, algo que deveria ter sido realizado antes mesmo de os blocos serem ofertados em leilões.
Apesar de a AAAS ser indicada para antes de leilões, ela ainda pode ser realizada na foz do Amazonas, mesmo após o leilão. “O ideal seria suspender todos os pedidos de licenciamento, não apenas o do bloco 59, até que uma AAAS seja feita na região”, diz Suely Araújo, especialista sênior em políticas públicas do Observatório do Clima.
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Foto: Marizilda Cruppe / Greenpeace
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Risco de desmatamento na BR-319 já era conhecido há duas décadas |
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No ano passado, Eduardo Bim, então presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), concedeu a Licença Prévia (LP) para o asfaltamento do chamado “trecho do meio” da BR-319, estrada federal que liga Manaus, no Amazonas, a Porto Velho, em Rondônia. Contrariando orientações técnicas do próprio Ibama, Bim não hesitou em avançar na pavimentação da “estrada para o inferno”, cujo potencial destrutivo já era mais do que conhecido.
A licença apresenta uma evidente fragilidade por não conter ações para evitar o desmatamento, a invasão de terra pública a e grilagem – crimes que costumam acompanhar a pavimentação de uma estrada na região amazônica. Especialistas do Observatório do Clima explicam que a licença não deveria ter sido liberada sem condicionantes específicas sobre o tema. O documento chega a mencionar a instalação de três postos de monitoramento e segurança “conforme evoluírem as tratativas para fortalecimento da governança territorial” – o que é vago e insuficiente. A governança para controle do desmatamento na região, inclusive, deveria ter sido implementada antes da liberação da licença.
O risco de devastação da floresta com o asfaltamento da BR-319 já era alertado pelo próprio governo federal ao menos desde 2004. Naquele ano, o Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm) incluía a rodovia na relação de obras que poderiam abrir novas frentes de ocupação em regiões vulneráveis.
A LP é a primeira etapa do processo de licenciamento. Na sequência, deve ser elaborado o Plano Básico Ambiental (PBA). Se o PBA for aprovado pelo Ibama, será concedida a Licença de Instalação (LI) para o início das obras e, depois, a Licença de Operação (LO) para liberar o tráfego na via. É preciso reverter esse desastre imediatamente.
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Décimo relatório do SEEG mostra aumento de 40% na poluição climática brasileira desde 2010 |
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Lançado na última quinta-feira (23/3), o décimo relatório de análise das emissões brasileiras do SEEG, o Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa do Observatório do Clima, mostrou que as emissões brasileiras de gases de efeito estufa cresceram 40% desde o ano em que o país decidiu tomar uma atitude para combatê-las.
Em 2010, quando o país regulamentou a Política Nacional sobre Mudança do Clima, a PNMC, as emissões brutas de gases de efeito estufa eram de 1,7 bilhão de toneladas. Em 2021, ano da última estimativa do SEEG, eram 2,4 bilhões.
A maior parte da culpa, você adivinhou, é do desmatamento. O Brasil passou longe de cumprir a principal meta da PNMC, de reduzir em 80% a taxa de destruição da Amazônia. Ao contrário, em 2022 o desmatamento era quase três vezes maior do que os 3.925 km² preconizados pela meta. Em 2021, as emissões brutas por desmatamento em todos os biomas brasileiros haviam atingido 1,19 bilhão de toneladas (Gt) de gás carbônico equivalente (CO2e). É mais do que o Japão emite em um ano. Em relação a 2010, as emissões por mudança de uso da terra cresceram 83% no Brasil.
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E por falar em emissões...
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Relatório-síntese do IPCC alerta para emergência humanitária |
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Uma questão de sobrevivência: ou mudamos a rota agora, ou nos restará a catástrofe. O alerta – mais um, só que ainda mais enfático – está no relatório síntese do IPCC (sigla em inglês para Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática, da ONU), publicado na última segunda-feira, após uma semana de intensa negociação entre governos e cientistas.
O documento não chega a ser inédito, já que se trata de um apanhado dos últimos seis relatórios publicados pelo IPCC, mas funciona como a mensagem final dos cientistas nesta década crítica, visto que o próximo ciclo de análise só deve começar a ter resultados por volta de 2028.
Para quem achava que a mudança climática era uma fantasia, o texto mostra que a realidade bateu à porta: em 2019, a concentração atmosférica de CO2 (410 partes por milhão) foi a maior em pelo menos 2 milhões de anos, e as de metano (1.866 partes por bilhão) e óxido nitroso (332 partes por bilhão), as maiores em 800 mil anos. Setenta e nove por cento das emissões globais de gases de efeito estufa vieram dos setores de energia, indústria e transporte e 22% da agricultura, silvicultura e de outras formas de uso da terra.
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E por falar em emissões (de novo)...
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Produção e consumo de alimentos podem aumentar aquecimento em 1ºC até 2100 |
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Estudo publicado na revista Nature Climate Change mostrou que, se mantidos os atuais padrões de produção e consumo de alimentos no mundo, a meta de estabilizar o aquecimento do planeta em 1,5ºC acima dos níveis pré-industriais está fadada ao fracasso. Até 2021, o mundo já estava 1ºC mais quente. Sozinhas, as emissões de gases de efeito estufa pelo sistema alimentar (que engloba desde os métodos de produção até o consumo de alimentos) aumentarão a temperatura da Terra em até 1ºC até 2100.
A boa notícia é que ainda há tempo de agir: ações de mitigação para o sistema alimentar, se implementadas imediatamente, podem reduzir em até 55% o aquecimento projetado para as emissões do setor.
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Bioma pode perder um terço da água até 2050 |
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Estudo publicado em fevereiro na revista científica Sustainability mostrou que o Cerrado pode perder 34% de seu volume de água – o equivalente à vazão de oito rios Nilo – até 2050. A causa principal é o uso do solo pela agropecuária. O estudo foi capitaneado pelo cientista florestal Yuri Salmona e teve apoio do Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN). Salmona e outros dez pesquisadores, que também assinam o texto, analisaram 81 bacias hidrográficas no Cerrado no período entre 1985 e 2022. Destas, 88% já apresentam diminuição da vazão.
Hoje, no Brasil, 80% da água está comprometida com o agronegócio. E também hoje, no mundo, 700 bilhões de dólares (ou R$ 3,7 bilhões de reais) são gastos anualmente com subsídios para o uso da água no agronegócio, de acordo com o relatório publicado pela Comissão Global sobre a Economia da Água, sediada na Holanda. Ou seja: assim como ocorre com o combustível fóssil, o financiamento público continua fluindo em direção a quem causa, e não a quem propõe solucionar o problema. “Não haverá revolução possível na agricultura se não resolvermos o uso da água”, disse Johan Rockstrom, autor do relatório.
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