A três semanas das eleições presidenciais, o governo de Jair Bolsonaro entregou o Orçamento da União para 2023 ao Congresso, com a proposta de cortar em 60% as verbas destinadas ao programa Farmácia Popular. Na mesma toada, o governo sugere o corte de 59% dos investimentos destinados à saúde indígena, que de R$ 1,64 bilhão passaria a contar com R$ 664,6 milhões.
Logo após a notícia dos planos de Bolsonaro para 2023, um levantamento elaborado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) apontou que, em apenas 8 meses, 16 crianças indígenas morreram de diarréia no interior do Acre. Segundo a pesquisa, uma criança indígena tem 14 vezes mais chances de morrer pela doença quando comparada a uma criança branca.
“Achei essa porcentagem até branda”, diz Marcos Sabarú, assessor político da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib). “Somos mais vulneráveis. Não é só desnutrição e diarreia, estamos morrendo de tuberculose, febre amarela, chicungunha. O índice de mortalidade é grande”, desabafa. Sabarú pertence à etnia Tingui-Botó, do Baixo São Francisco, em Alagoas. Ele conta que doenças ligadas à falta de água tratada, como a diarréia, são comuns em grande parte das terras indígenas: “hoje os rios não são limpos como antigamente”, lembra.
Soma-se à falta de saneamento básico a falta de alimento, sintoma não apenas da desigualdade, mas da falta de demarcação das áreas indígenas. O aumento do desmatamento e das queimadas, ambos ligados à ação do garimpo e da extração ilegal de madeira, vem causando um duro impacto na fauna e flora regionais, o que, segundo Sabaru, impede que comunidades sigam vivendo da caça e da pesca. O desequilíbrio ambiental leva ao consumo de produtos industrializados encontrados nos mercados e, diante da falta de recursos, à desnutrição.
O fornecimento de água potável, junto do atendimento às comunidades indígenas, é responsabilidade da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), órgão ligado ao ministério da Saúde e que pode ter seu orçamento cortado em 2023, caso Bolsonaro seja reeleito. Desde 2010, quando pela primeira vez passou a existir um órgão responsável unicamente pela saúde indígena, a Sesai passou a coordenar os 34 Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs), que promovem o atendimento de casos simples – quando trata-se de um caso complexo, o paciente é encaminhado aos hospitais regionais e entra na rede SUS.
A descentralização do atendimento, que veio com a chamada Lei Arouca, em 1999, representou um avanço. A Fundação Nacional de Saúde (Funasa), responsável por administrar a saúde indígena pelo SUS até aquele ano, era alvo de denúncias de corrupção e desvio de recursos. A saúde pensada para os povos indígenas era recente: foi apenas na Constituição de 1988 que passaram a existir políticas públicas voltadas para os povos originários – não enquanto indivíduos tutelados pelo Estado, mas como cidadãos.
Ainda assim, os problemas são múltiplos. Apesar da criação dos distritos ser um marco positivo, não há uma diferenciação clara entre os planos de ação em cada um deles, necessária pelas demandas de cada território. “Um está precisando de ambulância, de carro, o outro de caminhonete, em uma região o problema é a malária, em outra não tem essa doença”, exemplifica Sabarú. A incidência de doenças como a malária, tuberculose e Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs) vem avançando sobre os povos indígenas de diferentes regiões do país, revelando dificuldades no atendimento e a decadência da infraestrutura disponível.
“Deveria ter médico, mas raramente tem”, explica Ana Lúcia Pontes, pesquisadora da Fiocruz e coordenadora de Saúde Indígena da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco)...
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